Aprovado e sancionado pela presidente Dilma Rousseff no dia 05 de Agosto de 2013, o Estatuto da Juventude, que passa a vigorar em fevereiro do ano que vem, se aprofunda nos direitos da juventude, como tabalho, educação, cultura, expressão, entre outros. Eram direitos já existentes e previstos em lei, mas que agora foram “melhor estudados” para essa faixa etária – observem que é considerado jovem aquele tem que entre 15 e 29 anos.
O Estatuto de modo geral garante muitas coisas importantes e, inclusive, trouxe benefícios novos super legais, como este que não tínhamos ainda:
O projeto previa descontro de 50% também nas passagens de ônibus interestaduais, mas o artigo foi veitado pela presidenta Dilma Russeff. O que está mantido é a reserva de duas gratuitas e de duas meia-passagens para jovens de baixa renda em ônibus interestaduais, conforme ordem de chegada. (fonte aqui)
Mas de que adianta dar com uma mão e tirar com a outra? O EJ pecou e pecou muito feio numa restrição que ao invés de avançar nos direitos da juventude, retrocede e diminui um direito que já existia. Estou falando da meia-entrada e o que está por trás da restrição. Vamos aos poucos!
Contradições da meia-entrada
A meia-entrada é um direito antigo, mas que antes não era regulamentado por lei federal. Assim, mudava de lugar pra lugar uma vez que era regido por leis estaduais – por exemplo: no Paraná, doadores de sangue também têm direito a pagar apenas 50% do valor total. Aqui vai uma tabela para resumir o que mudou nesse tema:
Image may be NSFW.
Clik here to view.
A ampliação do direito de meia-entrada para jovens de baixa renda em geral (não necessariamente estudantes) acabou sendo uma faca de dois gumes: é um ótimo dispositivo social, caso a intenção seja inclusão social e efetivação do direito à cultura a todos, mas com a limitação de 40% dos ingressos pode ser algo ruim também. Uma vez aplicada a teoria, a nova proposta estabelece o direito de forma nada democrática: dada a limitação de 40%, a ordem de chegada é que define quem paga meia e quem paga inteira; não respeita ou fomenta, na realidade, se quem pagou é baixa renda, estudante ou idoso. Vai virar uma corrida contra o tempo? Quem define que quem chegou depois é menos “estudante”, menos “jovem”, mais “rico” ou tem menos direito que os sortudos que conseguirem fazer parte da porcentagem destinada à meia-entrada? Quem garante a fiscalização para que não haja bilheterias oportunamente a dizer que os 40% já acabaram, fazendo os estudantes pagarem a entrada inteira sem ter a certeza? Curioso, até achei que fosse pra todos quando li a constituição federal… Ou seja: nesse aspecto, o Estatuto da Juventude se contradiz e vai exatamente de encontro ao que idealmente propõe, que é o acesso à cultura.
Pois não bastasse essa ideia “genial”, temos que pensar além da superfície. Se isso foi aprovado é porque interessa a alguém. A moeda tem dois lados: se um saiu no prejuízo, então quem foi o outro que saiu no lucro?
Interesses & Oportunistas Cia. Ltda.
Temos aqui muitos interessados que devem estar sorrindo pras paredes com a aprovação da proposta: os empresários do meio cultural e as próprias associações que terão o monopólio completo das carteirinhas (UNE, ANPG e UBES).
Repare, na tabela, que antes toda identificação que te caracterizasse como estudante servia, desde a carteirinha da biblioteca ao cartão da escola de línguas ou a simples apresentação da planilha junto de um documento com foto comprovando sua identidade. Com a aprovação do EJ, somente carteirinhas da UNE, UJS e UBES serão aceitas. São entidades estudantis de participação política – nem vou entrar no mérito e caráter duvidoso que têm; eu mesma não me sinto representada por qualquer uma delas enquanto estudante – que atuam em âmbito nacional e nem por isso são conhecidas por toda a tal comunidade que representam. A majoritária da União Nacional dos Estudantes até mesmo recebe fundos estatais e patrocínios privados! Mas isso é pra outra conversa…
A questão aqui colocada é: para usufruir do direito de meia-entrada, todos os estudantes deverão se filiar a uma dessas associações, independente de concordar com sua linha política ou saber o que fazem. Apenas terá o direito quem a elas for filiado. Segundo ponto: diferente das outras formas de identificação, essa filiação não é gratuita. Se não me engano, o último valor de que me recordo para fazer uma carteirinha da UNE era R$ 45,00 reais. Quer dizer: se eu quiser usufruir de um DIREITO LEGISLATIVO que possuo, enquanto jovem amparada pelo estado, devo fazê-lo me associando a uma entidade com a qual não concordo e ainda pagar por isso? Direta e indiretamente, estaremos todos financiando essas corporações, quer queiramos quer não.
Pronto, esclarecemos um ponto obscuro e muito “engraçado” do novo estatuto. Agora, por que me referi aos empresários da cultura?
É simples, mas quero lembrar primeiro que não estou me posicionando contra a classe artística, os trabalhadores da arte e da cultura, mas sim os EMPRESÁRIOS. Os que lucram com isso, os donos de grandes centros e locais de lazer: donos de cinema, de teatros, de casas de show, etc. É a eles que me refiro. Pensem comigo: se apenas 40% dos ingressos serão destinados à meia-entrada, significa que os outros 60%, aos quais costumávamos ter direito, voltarão ao seu preço comum. Ou seja, mais da metade voltará ao preço integral, independente de quem seja seu comprador. Lucro na certa! Isso quer dizer que antes eles tinham prejuízo nesses 60%? Claro que não. Não sejamos ingênuos. O valor era jogado nos demais ingressos, obviamente, e também em outros produtos (como itens da bomboniere) que normalmente são também adquiridos pelo consumidor. Então só será uma margem de lucro maior, nada além disso!
Quer a nossa presidente e essas entidades estudantis fazer com que agradeçamos por essa “vitória”? Quer que fiquemos felizes? Devemos beijar seus pés também? Não adianta sancionar se houver retrocessos! Não aceitamos direitos a menos!
Convite à mobilização
A cultura é, sem dúvida, um dos pilares fundamentais da sociedade. Não é só um instrumento de integração social e lazer, mas também é formador de identidade e fomenta o saber. Ela estimula o pensamento e a reflexão. Ora, por que nos limitar isso? Restringir-nos desse direito, esse instrumento de saber, para gerar mais lucro aos grandes empresários? A prioridade está bem estabelecida e, pelo jeito, não somos nós.
Convido a todos, depois dessa leitura, a procurarem quem são os núcleos que estão se mobilizando para isso na sua cidade. Se ainda não existe, reúna um grupo e comece. É um trabalho de formiga, mas deve ser feito e corremos contra o tempo. O fato de ser uma lei aprovada não a torna irrevogável nem imutável, devemos ir à luta por isso e não temos que esperar pra sentir na pele essa restrição!
Já divulgo aqui aos meus conterrâneos de Cuiabá (MT) que existe página e grupo no facebook do grupo que está articulando contra a restrição da meia-entrada. Não somos contra o Estatuto, somos contra a restrição! Restrição que garante o monopólio à entidades estudantis que não representam a todos os estudantes e que prioriza o lucro dos empresários à cultura do povo. Segue abaixo link do grupo e página aos interessados:
Contra a restrição da meia-entrada – Cuiabá (grupo)
Mobilização contra a restrição da meia-entrada – Cuiabá (página)
Image may be NSFW.
Clik here to view.
Clik here to view.
